Meire Poza é pivô de provas ilegais na Lava Jato, indicam documentos
CartaCapital teve acesso a um conjunto de trocas de mensagens, vídeos, fotos e documentos que revelam que integrantes da Operação Lava Jato podem ter feito uso de provas ilegais, vazado informações confidenciais, forjado buscas e apreensões e usado uma informante infiltrada irregularmente. São diálogos entre agentes e delegados da Polícia Federal e Meire Poza, contadora e ex-braço direito de Alberto Youssef, principal delator do escândalo de corrupção na Petrobras.
O que será narrado a seguir mostra que, à margem da lei, a força-tarefa pode ter colocado todo o trabalho de três anos de investigação em risco por conta do “justiça a qualquer preço”. Eventualmente, a chamada doutrina jurídica dos frutos da árvore envenenada pode fazer com que todas as provas e missões concluídas sejam questionadas e até invalidadas pela Justiça. Outras operações, entre elas a Castelo de Areia, foram anuladas por supostamente conterem erros de procedimento.
A revista questionou a contadora a respeito dos documentos. Meire ameaçou processar o veículo, caso as conversas e dados fossem divulgados. A contadora publicou um livro faz dois meses expondo sua intimidade com os bastidores da operação, mas não revelou na ocasião todas as conversas e nem explicou à reportagem a omissão de tais fatos.
A revista decidiu tornar pública toda a documentação e revelar os fatos que serão expostos a seguir.
A história que se segue começa a ser contada em meados de 2012, quando a contadora esteve na sede da Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. Poza, ainda não se sabe o motivo, decide denunciar a existência de um esquema de fraudes em fundos de pensão privados operados em conluio pelo doleiro Alberto Youssef e agentes de vários estados. Um delegado da PF em São Paulo que a recebeu deu de ombros. Nenhum depoimento foi colhido e nada foi feito para apurar as denúncias.
Dois anos mais tarde, quando a investigação da Lava Jato ganhou as ruas, em março de 2014, Meire procurou a PF mais uma vez e desta vez foi ouvida. Ela foi recebida em São Paulo pelo delegado Márcio Anselmo, líder do grupo que investigava lavagem de dinheiro por meio de doleiros a partir de Curitiba. Até aquele momento, a força-tarefa não fazia a mínima ideia onde a Lava Jato iria chegar e sabia-se apenas que era mais uma investigação contra lavagem de dinheiro.
CartaCapital apurou que foi feito um acordo com a contadora: ela forneceria informações dos investigados e vazaria documentações em troco de não ser processada. E há indícios de que isso de fato ocorreu. Embora seu escritório tenha lavado 5,6 milhões de reais de Youssef, Poza nunca foi sequer indiciada. CartaCapital teve acesso a trocas de mensagens, fotos, vídeos e documentos entre Meire e integrantes da força-tarefa que datam de 5 de maio de 2014 a março de 2015.
Um dos diálogos que mais chamam atenção trata da farta documentação escriturária e contábil das empresas de fachada de Youssef. Meire tinha em seu poder caixas de documentos com contratos fictícios da RCI, MO Consultoria, GDF e Empreiteira Rigidez. Companhias que só existiam no papel, mas serviam para Youssef receber propina das maiores construtoras do País.
A força-tarefa não fazia a mínima ideia da existência desses documentos. Era um acervo que identificou que Youssef recebia dinheiro das maiores construtoras do País por serviços que nunca prestou. As caixas foram entregues pela contadora, em março de 2014. No entanto, como a documentação foi entregue de maneira aparentemente ilegal, a força-tarefa precisava “esquentar a documentação” na gíria policial.
Em 5 de maio, o delegado Márcio Anselmo fala com Poza pelo aplicativo de conversas WhatsApp. “Devemos acertar para a prox semana uma viagem a sp para formalizar a apreensão daqueles documentos”. Poza responde: “Te aguardo!!!”. O delegado continua: “Se puder já separe todo o material dos contratos da gfd”.
A busca acabou se dando em 1º de julho de 2014, durante a 5ª fase da Operação Lava Jato. Um indicativo de que a Polícia Federal marcou dia e hora para uma busca e apreensão desnecessária. Uma diligência que deu ensejo ao uso de documentos que municiaram grande parte de tudo o que veio a ser descoberto.
Em um dos diálogos, o delegado indica que buscaria o Ministério Público Federal e que levaria ao conhecimento dos procuradores a relação com a contadora: “Vou conversar c o mpf sobre a sua situação”.
Fonte: Carta Capital